Depois de cinco dias de acampamento, acabou na sexta-feira (27/04) a ocupação do Centro Integrado de Cultura (CIC) por artistas, produtores e ativistas culturais, que permaneciam em frente à entrada principal do prédio desde o dia 23/04. A ideia era entregar, em mãos, ao presidente da Fundação Catarinense de Cultura (FCC), Joceli de Souza, uma carta com uma serie de reivindicações listadas pela comunidade artístico-cultural catarinense, o que não aconteceu.
Acabou a ocupação, mas não o movimento. Na verdade, o que começou a partir de uma ação do Fórum Catarina de Cultura – que deu início à mobilização para a entrega da carta -, ganhou uma nova configuração e deu origem ao Ocupa CIC, apontado por alguns dos participantes como um “movimento anárquico em prol da cultura catarinense”, e que mobilizou a comunidade artística também em outros municípios. Na sexta-feira, portanto, já existiam duas vertentes do movimento, que se misturavam na articulação e na disposição de buscar alternativas para a cultura no Estado.
De acordo com o manifesto elaborado pelo movimento, o Ocupa CIC congrega forças e dá visibilidade ao descontentamento em relação ao descaso do governo com as políticas públicas culturais, e nesse sentido o prédio do CIC foi considerado um local emblemático, pois, segundo afirmam, simboliza o descaso do governo com a cultura. “Aqui temos um teatro fechado, uma sala de cinema que perdeu sua característica de cineclube e um museu sem uma programação anual”, diz o documento.
“Há anos tentamos ser ouvidos pelo governo, e pedimos, quase sempre, a mesma coisa: uma secretaria específica, espaço e respeito à cultura, políticas públicas efetivas e mais próximas dos artistas e produtores culturais, dentre outras coisas”, afirmou Fátima Lima, professora de artes cênicas na UDESC, que participou do movimento da semana passada. Para ela, a classe artística está totalmente envolvida com o movimento Ocupa CIC, onde se vê representada por uma ala jovem, comprometida e com fôlego para levar as manifestações adiante. “É muito importante perceber a continuidade desse processo concretizada através de ações”, explicou.
Após a leitura do manifesto, de mãos dadas, os participantes fizeram uma grande roda e gritaram um sonoro “merda”, numa alusão à saudação que pode ser considerada um mantra, parte de um ritual usado pelos atores de teatro antes de suas apresentações. Depois disso, escoltados por batedores da Polícia Militar, saíram em fila pela Avenida Beira-Mar Norte, carregando barracas e tocando instrumentos musicais, que foram sua companhia constante durante a ocupação.
Durante a caminhada – que percorreu a avenida, com paradas estratégicas próximo à casa do governador e no Beiramar Shopping – o número de manifestantes variava: em alguns momentos chegou perto de 100, e em outros eram aproximadamente 70 pessoas. Conseguiram chamar atenção, com certeza, e provocar um pequeno engarrafamento. Nos contatos com motoristas e pedestres, distribuíam folhetos e explicavam o porquê do movimento, atitude necessária para tornar pública e conhecida uma manifestação que, até agora, não foi comentada pelo governo do estado ou mesmo pela Secretaria de Estado de Turismo, Cultura e Esporte (SOL).
A manifestação seguiu pelas avenidas Mauro Ramos e Hercílio Luz, com nova parada em frente à Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes (FCFFC). Em cada uma das paradas, acontecia a leitura do manifesto do Ocupa CIC.
Cidades como Criciúma, Joinville, Jaraguá do Sul, Itajaí, Rio do Sul, Chapecó, Blumenau e Xanxerê também participaram da manifestação. “Esse movimento agora deve se transformar em Ocupa Florianópolis, Ocupa Santa Catarina, enfim…., já estamos nesse processo”, comemorou Fátima Lima.
“Temos várias gerações no movimento e não me lembro de ter visto uma manifestação tão intensa no estado. A repercussão foi incrível e o movimento continua”, afirmou Daniel Olivetto, participante do Ocupa CIC.
CONTINUIDADE
Na manhã de sábado (28/04), em uma reunião – inicialmente programada para acontecer em frente ao Terminal Central (TICEN) mas transferida para o Terminal Cidade de Florianópolis devido a uma chuva fina – cerca de 20 pessoas fizeram uma avaliação do movimento e discutiram estratégias e próximas ações.
A participação presencial foi um dos itens mais discutidos durante a reunião, uma vez que o número de participantes oscilava dia a dia. “Mais importante ainda do que esses cinco dias, são os próximos dias”, opinou Luana Raiter, do Erro Grupo. Luana acredita que ao longo da semana o movimento cresceu muito, se não em número e presencialmente, em energia e disposição.
Reno Caramori Filho, da Cinemateca Catarinense, também avaliou o movimento de forma positiva. “Nem todo mundo tem a disponibilidade ou a cultura de participar ativamente de um movimento como esses, o que não significa que não esteja apoiando. Uma galera curtindo nas redes sociais e um número bem inferior presencialmente? Isso sempre vai acontecer”, opinou.
De forma presencial ou virtual, o certo é que o movimento conseguiu mobilizar um grande número de pessoas, e de acordo com alguns depoimentos, em determinados participantes despertou profundas reflexões, independente da geração a qual pertencem.
“O Ocupa CIC me cativou. Esse movimento foi responsável por despertar em mim, novamente, a vontade de viver em Florianópolis e trabalhar para que a cultura seja valorizada nessa cidade”, confessou Renata Herran, recém-formada em Artes Cênicas pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que em janeiro estava decidida a procurar um novo lugar para viver. “Esta semana experimentei um up-grade de 1000% na minha consciência cultural sobre a cidade e mesmo sobre o estado”, acrescentou.
A próxima ação programada pelo Ocupa CIC prevê uma manifestação aberta ao público em geral, em frente à SOL, na próxima sexta-feira (04/05), a partir das 12h00.