A abertura do 10° Fórum Social Mundial (FSM), na segunda-feira (25/01) em Porto Alegre, foi descontraída, empolgando o público presente, mas adicionando também um certo saudosismo. Isso ficou evidente nas falas dos convidados que relembravam a todo instante as primeiras edições do evento, o grande número de participantes, as iniciativas da sociedade civil que deram origem ao movimento e o eterno slogan “Um outro mundo é possível”.
Até aí, nenhuma surpresa, já que a abertura faz parte do Balanço dos 10 anos do FSM. Assim, era mesmo de se esperar que as lembranças sobre essa caminhada, que já comemora uma década, estivessem muito vivas nas mentes e discursos dos convidados.
Algumas surpresas surgiram sim, mas elas estavam nas avaliações, reflexões e tendências apresentadas durante toda a manhã aos mais de mil presentes que acompanharam a cerimônia na Usina do Gasômetro.
Já na abertura, o prefeito de Porto Alegre, José Fogaça, agradeceu às entidades organizadoras que trouxeram o evento “ao seu local de origem”, principalmente no momento em que o Fórum comemora sua décima edição. Fogaça anunciou a criação do Memorial do Fórum na cidade, que disponibilizará à população toda a trajetória do movimento, aclamado pelos presentes como a maior rede de cidadania democrática do mundo. Segundo o prefeito, todo o patrimônio ético, político e ideológico do FSM estará preservado nesse Memorial.
Idealizador do Fórum Social Mundial em 2001 e participante ativo do evento desde então, Oded Grajew destacou que na décima edição do FSM nos encontramos em um momento de comemoração e reflexão. Comemoração, principalmente, pelo aumento significativo do número de entidades envolvidas, o que referenda a importância e o fortalecimento do encontro a cada ano que passa. Reflexão porque se trata do momento de avaliar a repensar os passos do movimento e modernizar suas ações. “Um outro mundo é possível, sim, e o Brasil de hoje é diferente do Brasil de 10 anos atrás. O Fórum, portanto, também é diferente”, emendou.
As diretrizes lançadas no primeiro Fórum Social Mundial, que defendiam essencialmente a ideia de que o neoliberalismo não era a única alternativa para o futuro do Planeta e que havia a necessidade urgente de se buscar políticas ambientalmente sustentáveis mostraram-se acertadas, segundo o presidente da Assembléia Legislativa do RS, deputado Ivan Pavan. “Os países que orientaram suas políticas sociais e econômicas nas diretrizes e prognósticos apresentados no primeiro Fórum Social, em 2001, foram os que menos sentiram os impactos da crise econômica de 2008”.
Essas colocações reforçam a proposta que embasou o movimento desde o seu princípio: um grande projeto mundial de mudança, com a conquista do protagonismo pelos movimentos sociais. Ou seja: a sociedade discutindo entre si e com o governo as alternativas para os problemas que a afligem e não o governo decidindo, verticalmente, as alternativas para os problemas, sejam eles econômicos, sociais, ambientais, etc..
João Pedro Stédile, outro participante histórico e ativo do Fórum, foi o responsável por colocações bastante pertinentes (e, em alguns momentos, cômicas) sobre os dez anos do FSM. Ele destacou, por exemplo, que a grande vitória do Fórum Social Mundial foi a de derrotar o neoliberalismo como ideologia, mas reconheceu algumas falhas no processo. “Falhamos, por exemplo, em acumular um comportamento mais propositivo e não reconhecer o momento de agir de forma mais efetiva”, afirmou, destacando quase que imediatamente a importância da participação do maior número possível de pessoas nas ações. “O Fórum nasceu como um evento massivo, e não poderia ser um encontro de sabidos que se reúnem para ditar regras para os outros”, afirmou.
No final de sua fala, Stédile fez uma analogia entre o evento e o futebol, dizendo que o Fórum é como se fosse a concentração antes de um jogo, aquela conversa de vestiário que antecede a partida. “Mas não é no vestiário que se ganha o jogo. Ali se decide como jogar, mas é no campo que as coisas se decidem”, concluiu.
Fazendo coro com Stédile, que afirmou que os grandes meios de comunicação não gostam do Fórum Social Mundial, o representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT,) João Felício, lembrou que o Fórum sempre foi e será o espaço da diversidade. “Aqui tem de tudo. Aqui tem gente que combate o que o imperialismo fez de mal para o mundo. Aqui só não tem neoliberal, e é por isso que a imprensa tradicional não gosta de nós”, afirmou. Para ele, é essencial que se respeite essa diversidade geradora de uma rica pluralidade de ideias, mas seria de extrema importância elaborar uma plataforma com as questões levantadas no FSM para direcionar as ações dos movimentos sociais. “Assim, teríamos uma unidade maior dentro de nossa diversidade”, pondera.
Festejado mesmo quando seu nome era apenas citado pelos palestrantes da abertura do FSM, o ex-governador, Olívio Dutra, ganhou aplausos calorosos dos presentes ao lembrar que a maior importância do evento está no fato de colocar a pessoa como sujeito e não como objeto da política: “O correto é a sociedade controlar o estado, e não o estado, através de seus governantes, controlar os movimentos sociais”, afirmou, lembrando que é de extrema importância que o Fórum busque uma centralidade em suas ações, porém sem centralismo.
Entre ideias, propostas, reflexões e memórias, a abertura do FSM teve de tudo um pouco. Aplausos efusivos para Dutra, vaias contundentes para o governo de Yeda Crusius; críticas aos meios de comunicação de massa, exaltação à imprensa alternativa; encontro de representantes de diversos países e foco nas questões locais… Diversidade acima de tudo. E é por isso que, mesmo passados 10 anos, o Fórum Social Mundial continua aglutinando pessoas ao redor da ideia de que o novo mundo (ainda) é possível.